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“A sociedade também precisa meter a colher”, diz secretária sobre violência de gênero
“Não existe mais esse ditado de que em briga de marido e mulher não se mete a colher.” Com essa declaração, a secretária de Políticas para as Mulheres de Pelotas, Marielda Medeiros, sintetizou o espírito do Agosto Lilás no município: envolver toda a sociedade na prevenção e no enfrentamento das violências contra as mulheres. Segundo ela, a responsabilidade de proteger vidas é coletiva — e precisa ser assumida com urgência.
Durante entrevista ao programa Contraponto, da RádioCom Pelotas, Marielda falou sobre os 19 anos da Lei Maria da Penha, os desafios locais para sua plena aplicação e as ações da Prefeitura para ampliar o acolhimento, a proteção e a consciência social. A conversa foi marcada por dados preocupantes, relatos sobre a atuação em rede e o anúncio de uma série de iniciativas previstas para o mês de agosto.
O impacto da Lei Maria da Penha na realidade brasileira
Para Marielda, a Lei Maria da Penha foi um divisor de águas. “Hoje, a violência encontra políticas públicas nos níveis federal, estadual e municipal. Isso é fruto direto da existência da lei e da luta das mulheres”, afirmou. A criação do Ministério das Mulheres e de secretarias específicas em estados e municípios — como em Pelotas — reflete essa transformação institucional.
A memória de Maria da Penha Maia Fernandes, mulher que se tornou símbolo da luta após sobreviver a duas tentativas de feminicídio, segue inspirando ações concretas. Marielda enfatizou que a rede de enfrentamento no município só tem sentido se estiver integrada e conectada com todas as áreas da sociedade — de outras secretarias municipais a instituições de ensino e movimentos sociais.
A secretária reconhece, no entanto, que a efetivação da lei ainda enfrenta entraves estruturais. “Cidades de porte médio, como Pelotas, precisam de mais investimento e de uma atuação transversal entre os órgãos. Mas estamos avançando e o diálogo com outros setores tem sido essencial.”
Violência de gênero em Pelotas: realidade e números que exigem ação
Pelotas contabiliza, só em 2025, um feminicídio consumado, duas tentativas, 463 ameaças, 19 estupros e 382 casos de lesão corporal. A cada dia, em média, duas mulheres são ameaçadas e outras duas agredidas fisicamente no município. As estatísticas escancaram a dimensão do problema.
Segundo o Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, já foram concedidas mais de 1.200 medidas protetivas neste ano. Cerca de 600 permanecem ativas, sendo monitoradas por diferentes instâncias da rede de atendimento, como o CRAM, a Patrulha Maria da Penha da Guarda Municipal e da Brigada Militar.
“O importante é a gente prevenir, porque não adianta só saber os números. A gente quer evitar que a mulher chegue a perder a vida”, afirmou Marielda. A secretária defende que a denúncia seja compreendida como ato de solidariedade, não como interferência indevida. “A sociedade tem que se sentir responsável. Hoje há segurança para denunciar, inclusive de forma anônima.”
Agosto Lilás: educação, acolhimento e visibilidade para a causa
A Prefeitura de Pelotas estabeleceu uma programação especial para o Agosto Lilás. Entre as ações previstas estão rodas de conversa, palestras, encontros com escolas e universidades, e a divulgação da campanha nacional “Não deixe chegar ao fim da linha. Ligue 180”.
Uma das atividades mais simbólicas será a instalação de dois bancos vermelhos na rodoviária da cidade, em parceria com a Eterpel, no dia 22 de agosto. O local também deverá receber uma sala de acolhimento para mulheres em situação de risco que chegam ao município durante a noite ou a madrugada.
O trabalho com as escolas também será intensificado. Neste mês, o Colégio Assis Brasil sediará um encontro com outras instituições de ensino da região, incluindo o IFSul. “A escola precisa estar apta a identificar os sinais e saber como agir. Muitas vezes, o professor é o primeiro a perceber que algo está errado”, explicou Marielda.
A educação, para ela, é peça-chave na mudança cultural que o enfrentamento à violência exige. “Não queremos responsabilizar a escola por tudo, mas é ali que podemos romper o machismo e a misoginia que ainda estruturam nossa sociedade.”
Atuação conjunta com o Estado e fortalecimento da rede
A retomada da Secretaria Estadual de Políticas para as Mulheres foi celebrada por Marielda como uma vitória do movimento feminista. “Essa conquista é fruto da luta das mulheres, e vem num momento crucial, em que os feminicídios seguem crescendo em todo o Estado.”
A integração entre esferas do poder público é vista como estratégica para garantir continuidade nas políticas de prevenção e acolhimento. “Municípios como Pelotas, que já têm secretaria própria, poderão se alinhar às ações estaduais para ampliar sua capacidade de resposta e atuação”, explicou.
Segundo a secretária, a construção de uma rede forte passa pela escuta, pelo respeito e pelo diálogo permanente. “Não é cada um no seu quadrado. É todo mundo junto, dialogando com fraternidade para proteger vidas.”
Serviço
Agosto Lilás em Pelotas
Durante todo o mês, em locais diversos
Descrição: Ações de conscientização, rodas de conversa, palestras, campanhas educativas e divulgação do Ligue 180.
Eventos gratuitos
Mais informações: redes sociais da Prefeitura de Pelotas e da Secretaria de Políticas para as Mulheres.
Destaque:
- Instalação de bancos vermelhos na rodoviária – 22 de agosto
- Encontros nas escolas com estudantes e profissionais da educação
- Parcerias com Eterpel, IFSul e outras instituições
*Confira a entrevista completa no canal da RádioCom Pelotas no YouTube.
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