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Contraponto: Projeto registra o legado de Sirley Amaro neste sábado e convoca memória viva da cidade

Contraponto: Projeto registra o legado de Sirley Amaro neste sábado e convoca memória viva da cidade

Quem atravessou Pelotas durante as últimas décadas pode ter cruzado com ela: um passo firme, uma mochilinha nos ombros, e um gesto de quem transforma o cotidiano em ensinamento. Mestra Griô Sirley Amaro foi costureira, educadora popular, artista e guardiã das tradições negras da cidade. Mesmo após sua partida, seu nome continua pulsando nas ruas, nos fuxicos, nas marchas e nas memórias que resistem. É esse legado que o projeto "Patrimônio Vivo", do portal Nonada Jornalismo, quer registrar com justiça e afeto.

O tema foi apresentado no programa Contraponto desta sexta-feira, 11 de abril, com as participações de Brenda Vidal e Anna Ortega. Brenda é jornalista e poeta; Anna, artista visual, jornalista e coordenadora de jornalismo do Nonada. Ambas participam do projeto que reúne histórias de oito mestres da cultura popular no Rio Grande do Sul. Em Pelotas, a homenageada é Sirley Amaro, escolhida de forma unânime em uma escuta afetiva com a comunidade cultural da cidade. Brenda estará em Pelotas neste sábado, 12, para produzir um retrato coletivo na Praça Pedro Osório, como forma de eternizar os rostos que compõem a rede afetiva da Mestra.

Uma convocatória à memória viva de Sirley Amaro

Com uma trajetória marcada pela oralidade, pela costura e pela presença constante nas ruas de Pelotas, Sirley Amaro tornou-se referência na cultura popular local. “A cidade escolheu e a gente acolheu”, diz Brenda, ao explicar como o nome da Mestra surgiu quase que naturalmente nas consultas feitas com artistas e mestres locais. A escuta indicou a força de uma mulher que transitava livremente por territórios culturais diversos: carnaval, tradição oral, oficinas de ancestralidade e ações afirmativas no campo da cultura negra.

O retrato coletivo programado para este sábado é, segundo as entrevistadas, uma forma simbólica de reunir aqueles que foram tocados por Sirley em vida. “Quem tiver um fuxico, uma peça dela, uma história ou apenas a memória de um encontro com essa mulher, está convidado a comparecer”, afirma Brenda. O material reunido — entrevistas, falas e imagens — será incorporado ao livro que está em produção pelo Nonada.

Anna Ortega complementa: “Queremos habitar essa memória com os rostos das pessoas que a Mestra tocou. Não é só contar a história dela — é contar com quem ela viveu essa história”. A equipe também estará no local para colher relatos e histórias espontâneas que ajudem a compor o mosaico sensível do projeto.

O projeto Patrimônio Vivo e a luta por reconhecimento

O livro “Patrimônio Vivo” irá reunir as histórias de oito mestres da cultura popular do Rio Grande do Sul. A seleção incluiu figuras com reconhecimento estabelecido e outras ainda invisibilizadas pelas políticas públicas e pela mídia. O critério foi a escuta comunitária e a intenção de refletir a diversidade de expressões culturais presentes no estado. “São mestres da região de Porto Alegre, da região metropolitana, de Pelotas e de outras localidades. A gente quis equilibrar quem já tem visibilidade com quem ainda precisa ser visto”, explica Anna.

O projeto também denuncia uma realidade estrutural: a precarização e a invisibilidade dos mestres da cultura popular no Brasil. “Durante a pandemia, muitos mestres morreram sem acesso à saúde. A gente escuta histórias repetidas de abandono, de falta de recursos, de mestres que não conseguem sequer ir às escolas para transmitir seu conhecimento”, alerta Anna. Ela cita o exemplo do mestre Chico, de Porto Alegre, que domina línguas como o iorubá, mas não tem apoio financeiro para oferecer oficinas.

Brenda destaca que o reconhecimento da Mestra Sirley se fortaleceu a partir do programa Cultura Viva, política pública que lhe concedeu o título de Mestra Griô. Com esse reconhecimento, ela pôde deixar sua atividade como costureira e dedicar-se integralmente à cultura popular durante cerca de 20 anos. “Se essa atividade fosse reconhecida como ofício principal, com remuneração adequada, quantos outros mestres poderiam ter florescido mais cedo, por mais tempo?”, refletiu Brenda durante a entrevista.

Escuta sensível, legado coletivo e presença futura

O projeto tem como uma de suas marcas o olhar afetuoso e comprometido da equipe com as comunidades representadas. Ao todo, são oito repórteres mulheres, cada uma responsável por uma história. “Queremos imprimir nossos olhares, nossas escutas, nossa sensibilidade nesse material. É um trabalho coletivo e político, mas também profundamente pessoal”, diz Anna.

A previsão é que o livro seja lançado ainda no primeiro semestre. Enquanto isso, a equipe segue em fase de coleta de depoimentos, visitas às cidades e produção das reportagens. Mesmo com o sigilo temporário sobre os outros nomes que compõem o projeto, as jornalistas adiantam que o foco é valorizar a cultura popular como expressão de sabedoria e resistência. “Mestre é também intelectual. É educador, é pensador. Precisamos tirar esses saberes do lugar secundário”, afirma Anna.

O chamado, portanto, é para mais que uma foto. É para um gesto coletivo de reconhecimento. “Espero que amanhã a gente possa se encontrar, se olhar olho no olho e tirar essa foto que vai fazer parte desse livro. Que seja um registro com justiça, com afeto, com memória viva”, convida Brenda.

Serviço

Retrato coletivo em homenagem à Mestra Griô Sirley Amaro

Data: sábado, 12 de abril

Horário: 14h

Local: Praça Pedro Osório, Pelotas

Descrição: Encontro aberto para registro fotográfico com familiares, amigos e companheiros de vida e arte da Mestra Sirley Amaro. A foto integrará o livro "Patrimônio Vivo", projeto do Nonada Jornalismo. Leve um fuxico ou objeto simbólico que represente a Mestra.

Contato para mais informações: Brenda Vidal – (51) 98258-0435

Evento gratuito e aberto ao público.

*Confira a entrevista completa no canal da RádioCom Pelotas no YouTube.


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