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Dias mulheres virão (por Leonardo Melgarejo)

Dias mulheres virão (por Leonardo Melgarejo)

Semana do dia 8 de março, Dia Internacional da Mulher. Pessoas vendendo flores nas esquinas, escritórios distribuindo bombons para funcionárias e clientes.

Bonito, mas desajustado em termos de conteúdo e significado.

Acredito que nisso se revela uma tendência a ser enfrentada e corrigida. A de desvalorizar o presente sobrevalorizando o passado, os bons momentos dos velhos tempos, e sobrevalorizando o futuro, como que emitindo promissórias afetivas.

Uma tendência de levar o presente adiante, aos trancos e barrancos, sem refletir direito a respeito da importância do tempo real, o único que de fato existe.

Por isso, o 8 de março, dia de lutas, dia de sacrifício pelo reconhecimento da existência humana, dia de igualdade humana, é desrespeitado com atitudes gentis. É desvalorizado no presente como um dia de festa rápida, do bombom, da flor, do passeio.

Vale, é importante. Toda delicadeza é importante.

Mas o dia 8 de março não é o dia da floricultura, da neugebauer, da lacta, de presentinho destinado a limpar a barra, a ganhar créditos.

Por isso, há algo de errado nesta deturpação do dia 8 de março.

Viver o presente significa sintonizar o eu com o outro/outra. Significa sintonizar a vida com a vida dos outros, com a realidade do contexto. Entender que o presente é o futuro, e por isso deve ser honrado em sua totalidade.

E honrar o presente, viver o presente, exige reconhecer de onde ele vem, do que ele é feito. Exige honrar a luta das mulheres, por igualdade de fala, de salário, de respeito, de oportunidade. De acesso aos ouvidos da sociedade e dos poderes constituídos. De acesso às câmaras de vereadores, assembleias, secretarias de estado, ministérios, cadeiras nos campos de futebol e nas salas do STF.

Assim, a semana, o mês, a vida de todos que honram o 8 de março devem ajudar a entender que ali está um símbolo contra todas as discriminações, todos os racismos. Contra a homofobia, o machismo, o fascismo e todos aqueles que valorizam tais ofensas à vida.

Vejam o Augusto Arras, escondedor geral da República. Para ele o prazer das mulheres estaria na escolha da cor do esmalte das unhas, e dos sapatos.

Vejam que é o Procurador Geral da República. Um homem que talvez pense assim estar fazendo homenagem, mas está ofendendo a fundo e alimentando ofensas assemelhadas, por parte de outros a quem com certeza influencia. Ele está com isso alimentando desvios de conduta que potencializam desvios de interpretação a respeito de valores éticos, morais, humanos.

Distorce a noção de prazer em seus fundamentos e desrespeita o feminino que existe em tudo.

Mas há de agradar a alguém tão tosco como ele, afinal vive em um meio onde para o líder maior, ter uma filha implica na resignação diante do fracasso, de uma fraquejada.

Felizmente, também de Brasília, a semana nos trouxe o evento de 9 de março. O Ato Pela Terra, contra o Pacote da Destruição.

Ali sim estava o espírito do 8 de março, do presente a ser disputado para garantia de um futuro que honre as lutas do passado.

De um futuro que escancare os absurdos pretendidos por pessoas desrespeitosas, que querem destruir as bases do contrato social que nos humaniza. Eles pretendem aprovar leis absurdas que anulam direitos humanos, que ofendem a Constituição, que envenenam territórios, corações e mentes.

Projetos de um país sem alma, desenhado por pessoas desrespeitosas que ocupam e desqualificam espaços de responsabilidade pública e representação social, para onde ascenderam na marola do golpe de 2016.

É contra isso que a história das lutas glorificadas no 8 de março se impõe. Por um futuro sem ministros que alimentem desastres, sem governadores e presidente que nos envergonhem com mentiras cotidianas e reiteradas. Sem gente escrota alimentando engrenagens que se destinam a negar, em todos os lares, em todos os espaços públicos e privados, a importância e o protagonismo das mulheres.

Talvez pensem que com isso limitam o presente e o futuro de todos. Mas estão errados. O presente há de ser das mulheres e dos homens que as reconhecem como base para o futuro da própria terra.

:: Ouça aqui a coluna em áudio no Coletivo Catarse.::

Conforme divulgou a matéria do Brasil de Fato: Milhares de pessoas participaram de uma manifestação contra seis projetos de lei (PL): o PL nº 2.159, que torna o licenciamento ambiental uma exceção, em vez de ser a regra; o PL nº 2.633 e o PL nº 510, que concedem anistia à grilagem em terras públicas; o PL nº 490, que trata do chamado "marco temporal" das terras indígenas, que estabelece que povos indígenas só podem reivindicar as terras que eles ocupavam no momento em que a Constituição de 1988 foi aprovada; o PL nº 191, que autoriza a mineração e a construção de hidrelétricas em terras indígenas, até mesmo naquelas em que há indígenas isolados; e o PL nº 6.299, o chamado "Pacote do Veneno", que revoga a atual Lei de Agrotóxicos (7.802/89) e flexibiliza ainda mais a aprovação e o uso de agrotóxicos no país.

:: Conheça os projetos de lei que motivaram a convocação do protesto ::

https://www.youtube.com/watch?v=wAmtLN4PlLU

* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Katia Marko

Leonardo Melgarejo

Engenheiro Agronômo pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1976), mestrado em Economia Rural pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1990) e doutorado em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina (2000). Foi representante do Ministério do Desenvolvimento Agrário na CTNBio (2008-2014) e presidente da AGAPAN (2015-2017). Faz parte da coordenação do Fórum Gaúcho de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos (2018/2020 e 2020-2022) e é colaborador da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida, do Movimento Ciência Cidadã e da UCSNAL.


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