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Edição da Manhã: Especialista critica foco em classe média em novo estudo sobre a renda no Brasil
Um estudo da Tendência Consultoria divulgado no último domingo aponta que 50,1% dos domicílios brasileiros tiveram renda superior a R$ 3.400 por mês em 2024 - ou seja, fazem parte das classes A, B e C. Assim, o Brasil passa a ser considerado predominantemente um país de classe média. A economista do DIEESE e especialista em mercado de trabalho, Lúcia Garcia, participou do programa Edição da Manhã da RádioCom desta sexta-feira (10/1), quando trouxe uma visão crítica ao tema. Para ele, a repercussão ufanista do estudo “prejudica mais do que ajuda”.
Renda como métrica: limitações do conceito de classe média
Lúcia Garcia destacou que a classificação baseada em faixas de renda e consumo - como a utilizada no estudo - é problemática. “O conceito de classe média está relacionado à renda e padrões de consumo, mas categorizar a população dessa forma ignora as condições reais de vida e trabalho”, afirmou. Segundo ela, embora a pesquisa mostre avanços econômicos, os valores utilizados (R$ 3.400 a R$ 8.600) são insuficientes para definir qualidade de vida ou inclusão em uma classe média.
A economista também citou dados do DIEESE, que estimam que o salário mínimo necessário para sustentar uma família de quatro pessoas deveria ser de aproximadamente R$ 6.900, quase o dobro do limite inferior considerado como “classe média” pela pesquisa. "Essa classificação não reflete a realidade das famílias brasileiras, que enfrentam desafios cotidianos muito distantes do ideal de consumo associado à classe média", explicou.
Crescimento econômico: avanços que não chegam à população
Apesar de reconhecer os avanços econômicos promovidos pelo governo federal - como a redução do desemprego e o aumento da massa salarial - Lúcia enfatizou que o crescimento econômico não tem beneficiado amplamente a classe trabalhadora. “Embora estejamos em uma curva de melhoria, a distribuição dos resultados ainda é extremamente desigual”, destacou.
Ela apontou que a percepção da população sobre o crescimento econômico é limitada pela precariedade no trabalho e pelo baixo acesso a serviços básicos de qualidade - como saúde, educação e transporte. “A população sente o peso do custo de vida e não percebe uma melhoria significativa em sua qualidade de vida. Isso alimenta uma sensação de insatisfação”, completou.
Crítica ao foco no consumo e no empreendedorismo
Lúcia Garcia criticou a narrativa que vincula o crescimento econômico ao consumo e ao empreendedorismo. Segundo ela, o discurso do “Brasil de classe média” tende a reforçar uma visão meritocrática e consumista, afastando o debate político de questões estruturais, como a redistribuição de renda e a qualidade do trabalho.
“O conceito de empreendedorismo muitas vezes romantiza a sobrevivência de trabalhadores que não têm outra alternativa a não ser se auto-organizar. Eles não se veem como empreendedores, mas como lutadores diários”, disse. Para ela, esse debate desvia o foco de políticas públicas efetivas e pode deslegitimar as ações governamentais.
Reformas estruturais e desigualdade
A economista também relacionou a precarização do trabalho às reformas trabalhista, previdenciária e ao teto de gastos implementados entre 2016 e 2019. “Essas medidas reduziram os direitos dos trabalhadores, agravaram as condições de aposentadoria e limitaram o orçamento para políticas públicas essenciais”, explicou.
Ela destacou que, mesmo com indicadores econômicos positivos, como o crescimento do PIB, o Brasil ainda enfrenta uma desigualdade crescente. “Os resultados do crescimento econômico são concentrados, deixando a classe trabalhadora com uma fatia marginal desse bolo”, afirmou.
Uma visão alternativa para o desenvolvimento econômico
Lúcia concluiu a entrevista propondo uma mudança no debate público: “Precisamos focar na valorização do trabalho, na melhoria das condições de vida e na redistribuição de renda. Classificar a população como classe média com base em renda é um erro, pois ignora as reais necessidades dos trabalhadores”.
Ela ainda reforçou a importância de construir políticas públicas que priorizem o bem-estar da população, em vez de promover conceitos idealizados de progresso econômico. "A solução está em apoiar a classe trabalhadora, garantindo que o crescimento econômico realmente alcance as pessoas", finalizou.
* Confira a entrevista completa no canal da @RádioComPelotas no YouTube.
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