Incerteza no Instituto de Menores
Ex-ministros dos Direitos Humanos de FHC a Dilma lançam manifesto contra o ódio e pela democracia
“Eu não merecia, nos meus 90 anos, custar a dormir para querer saber como foi possível, depois de tanto esforço, tanta luta, tanto despojamento e desinteresse, o Brasil de repente ter uma plêiade de exímios inimigos dos direitos humanos. Que, como os outros, vão ser derrotados. Que, como os outros, já estão derrotados. Porque os direitos humanos hoje em dia são muito mais necessários, mais úteis e indispensáveis do que no passado.” As palavras são de José Gregori, primeiro secretário nacional dos Direitos Humanos (1997-2000), em encontro on-line na tarde desta sexta-feira (1°) para o diálogo sobre a “Construção e o Desmonte das Políticas Nacionais de Direitos Humanos no Brasil”.
A live faz parte do Ciclo de Memórias da Política Institucional Brasileira de Direitos Humanos, organizada pelo Grupo de Pesquisa Direitos Humanos, Democracia e Memória (GPDH) do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP). O encontro reuniu secretários dos Direitos Humanos dos governos Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Na ocasião, foi lançado o manifesto “Pela Reconstrução das Políticas de Estado de Direitos Humanos no Brasil”, em defesa do Estado democrático de direito, ameaçado pelo governo de Jair Bolsonaro (leia a íntegra). Além de Gregori, o documento é assinado pelos ex-ministros e secretários Gilberto Vergne Saboia, Paulo Sérgio Pinheiro, Nilmário Miranda, Mário Mamede Filho, Paulo Vannuchi, Maria do Rosário, Ideli Salvatti, Pepe Vargas, Nilma Lino Gomes e Rogério Sottili.
“Sobrou um mentecapto”
Em sua fala, Gregori se referiu a dom Paulo Evaristo Arns – arcebispo de São Paulo de 1970 a 1998 – como “mestre de todos”. Por outro lado, ele não poupou o atual chefe do governo brasileiro, que ao votar pelo impeachment de Dilma Rousseff, na Câmara dos Deputados, em 17 de abril de 2016, homenageou o torturador e assassino Carlos Alberto Brilhante Ustra.
“O que sobrou? Sobrou um mentecapto que, entre outras coisas, precisa um dia se explicar numa banca de especialistas o que a vida fez com ele no seu intimo, na sua alma, no seu coração, para ser tão teimosamente contra, tão burramente contra os direitos humanos”, disse o jurista. Ele demonstra confiança na vitória final da luta pelos direitos humanos e pela democracia.
“O ataque é muito grande”
“A caminhada dos direitos humanos, em primeiro lugar, não tem volta; em segundo lugar, não tem derrota; em terceiro lugar, exige de nós uma compreensão de que o tempo, a devoção, a insistência são absolutamente necessárias a nossa vitória”, aconselha. Mas ele alerta: “Nesse momento, a nossa altura deve ser a máxima possível, porque o ataque é muito grande. Vamos ganhar essa luta e vamos ser mais compreendidos do que nas outras vitórias.” Gregori afirmou não conhecer solução para a luta atual a não ser uma “que o papa atual (Francisco) resumiu naquela frase: temos que estar juntos”.
À RBA, Rogério Sottili, secretário especial de Direitos Humanos (2015-2016) do governo Dilma, também destacou a necessidade de união das forças democráticas na defesa do Estado Democrático de Direito, independentemente da “coloração política”. “Todo mundo que tiver compromisso com a democracia e o Estado Democrático de Direito deve estar junto. O que importa é a união do Brasil e pensar o Brasil agora e daqui para a frente. Depois as eleições resolvem. Cada um vai para suas forças politicas e disputa democraticamente”, diz.
O ex-secretário classifica como “muito importantes” as manifestações deste sábado contra Bolsonaro e pela democracia. “As mobilizações ainda não estão tão fortes. Amanhã vai ser um teste, com mobilizações em todo o país, dia 15 tem mais. Se isso crescer, a democracia respira e pode sair fortalecida desse processo”, avalia.
Retrocesso civilizatório
“O atual presidente foi eleito pautado no desrespeito à Constituição, aos pactos internacionais e às liberdades de expressão, de organização, de cultura e de arte, fazendo apologia à tortura, a crimes e à violência. É um processo de retrocesso civilizatório sem igual no país”, continua Sottili.
Em sua fala no evento virtual, a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS), também ex-ministra da Secretaria de Direitos Humanos (2011-2014), deu um “abraço” simbólico a Gregori e Sottili, “para ficarmos com as duas pontas desse processo de imenso compromisso ético-politico com os direitos humanos no Brasil”. Gregori, com FHC, foi o primeiro e Sottili o último a comandar os Direitos Humanos antes da derrubada de Dilma em 2016.
“É honroso para nós termos tomados nas nossas vidas uma decisão ética-politica pelos direitos humanos. E por isso sermos movidos pela indignação nos dias de hoje. Porque sabemos que o Brasil não é isso. Que o Brasil não precisa, não deve, não pode estar submetido à lógica do ódio, da destruição”, disse a deputada. “Porque nós aprovamos uma Constituição que nos arma com a única arma que queremos usar, que é a do Estado Democrático de Direito.”
Assista ao evento “Construção e o Desmonte das Políticas Nacionais de Direitos Humanos no Brasil”:
Por Eduardo Maretti, da RBA
Foto> Arquivo-Agência Brasil/ Reprodução Youtube/ Michel Jesus/Câmara dos Deputados - Rogério Sottili, José Gregori e Maria do Rosário fizeram parte do time dos direitos humanos em governos do país
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