"Maya", novo romance de Hilda Simões Lopes, reconstrói a força das vivandeiras e mulheres esquecidas da história
"Pelotas me pertence" guia celebração do Dia do Patrimônio com 66 atividades e 13 prédios abertos
Pelotas se prepara para viver, entre os dias 15 e 17 de agosto, um dos maiores eventos de celebração da memória e da identidade local: o Dia do Patrimônio. Com 66 atividades gratuitas e 13 prédios históricos abertos à visitação, a edição de 2025 traz como tema o potente lema "Pelotas me pertence". A proposta é provocar uma reconexão afetiva entre a população e os espaços históricos da cidade, ao mesmo tempo em que se constrói uma cultura de preservação coletiva.
Em entrevista ao programa Contraponto, da RádioCom Pelotas, Simone Delanoy, diretora de Memória e Patrimônio da Secretaria de Cultura (Secult), apresentou a programação e refletiu sobre os desafios e caminhos da educação patrimonial. Segundo ela, mais do que celebrar, o evento busca consolidar uma nova relação entre a cidade e seus moradores: "É um convite à apropriação no melhor sentido da palavra: cuidar, preservar, pertencer".
Pertencimento como política: um novo olhar sobre a cidade
O lema "Pelotas me pertence" não é apenas um tema para a edição deste ano, mas, como destaca Simone Delanoy, uma diretriz que deve nortear toda a gestão da Secretaria de Cultura. A ideia surgiu nos primeiros dias de planejamento do evento e ganhou força por expressar um desejo coletivo: que a população se veja como parte ativa do patrimônio.
"A gente quer que a criança, o jovem, o morador de bairro e o visitante se sintam conectados com os lugares, memórias e histórias que compõem Pelotas", explica. Para isso, a pluralidade é central: etnias, festas populares, religiosidades, saberes tradicionais e modos de vida são tratados como expressões vivas da cidade.
Essa concepção também desafia o poder público a ir além do centro histórico. Áreas como o Laranjal, as charqueadas e os Passos dos Negros estão no horizonte das próximas ações. “O Dia do Patrimônio é só o começo”, afirma Simone. “Esse tema vai guiar muitas ações ao longo da gestão.”
Educação patrimonial: começar pela criança para preservar o futuro
A entrevista destaca o papel da educação patrimonial como ferramenta de transformação social. Para Simone, o cuidado com os espaços urbanos e históricos começa na formação de uma nova geração mais consciente e conectada com a cidade. "É um trabalho de formiguinha, mas que dá frutos. Quando uma criança entende o valor de um prédio histórico, ela se torna defensora dele."
A proposta do evento não é apenas abrir prédios à visitação, mas promover experiências educativas. Exemplo disso é a Rua de Brincar, com atividades no Largo Andréa Fetter Zambrano, que convidam crianças a ocuparem o espaço urbano com jogos, música e interações livres, sem brinquedos industrializados. “Queremos retomar a rua como lugar de afeto e cultura”, explica.
Outro destaque é o cuidado com os próprios espaços públicos. Simone lembra que os prédios históricos passaram por limpeza especializada e alerta: "Cuidar do que é nosso é também não levar comida ou bebida para dentro, não depredar, não sujar. Isso é pertencimento".
Patrimônio em movimento: programação diversa e parcerias ativas
Com 66 atividades e 13 prédios abertos à visitação, a programação do Dia do Patrimônio impressiona pela diversidade. O Theatro Sete de Abril, por exemplo, estará acessível nos dias 16 e 17, com visitação ao hall e à plateia e exposição de achados arqueológicos recuperados em obras de restauro. "Pedimos cuidado, respeito, não entrar com comida ou bebida. Vamos manter o teatro como ele merece."
Outros espaços em destaque incluem o Museu da Baronesa, as Casas 2, 6 e 8, a Biblioteca, a Prefeitura, a Estação Férrea e a Santa Casa. Também há ativações em locais privados. Muitas das atividades contam com apoio das universidades, como UCPel, UFPel e IFSul.
Agentes do Patrimônio, voluntários formados por profissionais da Secult e das universidades, vão acompanhar as visitações guiadas. Eles receberam treinamentos sobre arquitetura, história e educação patrimonial para tornar a experiência mais rica.
Cultura viva: grafite, memórias e protagonismo comunitário
A programação deste ano também aposta na arte urbana e nas expressões culturais da comunidade. Um exemplo é a atividade de grafite nos tapumes do centro, organizada pela Secom em parceria com o coletivo Otroporto. "Vai ser uma surpresa boa: cor, alegria e ocupação criativa de um espaço que antes era cinza."
Outras propostas convidam a população a compartilhar suas histórias. A Cápsula do Tempo, no Parque da Baronesa, vai registrar depoimentos de memórias afetivas vividas naquele espaço. A expectativa é que o material se transforme em projeto de educação patrimonial.
A participação da comunidade também foi incentivada por meio de concursos e feiras. Um concurso fotográfico popular elegeu seis imagens que se transformarão em postais. "O olhar da comunidade mostra o que ela reconhece como importante. Isso também é educativo."
O que é considerado patrimônio? A inclusão de histórias esquecidas
Um dos pontos tratados na entrevista diz respeito ao que a sociedade reconhece como patrimônio. Apesar da proposta plural do evento, o concurso "Pelotas me pertence" acabou refletindo uma visão ainda concentrada: entre as imagens selecionadas estão o centro histórico, o Trapiche e o Quadrado, no bairro Porto. Mas locais importantes como o Passo dos Negros, com forte valor histórico e cultural, ficaram de fora.
"A gente abriu o concurso com a proposta de que cada pessoa fotografasse o que reconhece como seu em Pelotas. E as escolhas mostraram como ainda temos um olhar restrito sobre o que é valoroso", observa Simone. O resultado evidenciou a ausência de referências que historicamente foram silenciadas ou marginalizadas.
Essas escolhas têm efeitos culturais profundos. Ao reproduzir imagens dos mesmos lugares consagrados, a cidade reforça um imaginário limitado do que é patrimônio. "Por isso, a educação patrimonial é fundamental. Precisamos expandir o olhar e incluir todas as vozes e memórias que fazem Pelotas ser quem é."
Para isso, a Secretaria de Cultura se compromete com a descentralização das próximas ações. Projetos como "Se essa rua fosse minha" e o próprio "Pelotas me pertence" vão ganhar os bairros, os distritos, as margens. A memória coletiva precisa se tornar verdadeiramente coletiva.
Uma política pública em expansão
Mais do que um evento, o Dia do Patrimônio se consolida como estratégia de política cultural. Segundo Simone, as atividades descentralizadas devem ganhar força nos bairros e distritos. "Vamos levar o projeto Se essa rua fosse minha e o lema Pelotas me pertence para toda a cidade. A ideia é que as crianças dos Passos dos Negros, do Laranjal, das charqueadas, possam reconhecer seus espaços e produções."
As Quatro Conversas do Dia do Patrimônio, realizadas em julho, também mostraram a vocação do evento para o diálogo crítico. Temas como etnias formadoras, memórias LGBTQIA+, história da prostituição e urbanismo foram debatidos com universidades e instituições.
"O patrimônio não pode ser só passado: é presente e futuro. E ele precisa refletir a diversidade da cidade. Por isso, queremos manter esse formato de escuta ativa e envolvimento da comunidade", afirma Simone.
Serviço
Quando: 15, 16 e 17 de agosto (sexta a domingo)
Onde: 13 prédios históricos e dezenas de espaços culturais em Pelotas
Atividades: 66 ações gratuitas, incluindo visitações, oficinas, exposições, feiras, música, tours guiados, atividades infantis e intervenções artísticas
Mais informações: www.pelotas.com.br e @prefeituradepelotas
Destaque: Visitação ao Theatro Sete de Abril, Museu da Baronesa, Biblioteca, Santa Casa, Estação Férrea e outros patrimônios da cidade.
*Confira a entrevista completa no canal da RádioCom Pelotas no YouTube.
0 comentários
Adicionar Comentário