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Projeto investiga a história evanescente dos ofícios
Quem cresceu ouvindo o estribilho metálico reconhece na hora o seu significado. O som que anuncia a chegada do afiador de facas é herança portuguesa, terra onde o “apito de amolador” indica também o ofício de capadores de animais. Não é por acaso que nas terras além-mar corra o ditado: “quando se capa, não se assovia” – pílula de saber popular que aconselha a não começar uma nova tarefa antes de terminar a anterior.
Tradicional que seja, é cada vez menos comum ouvir o ruído característico pelas ruas de Pelotas. Em 12 anos de atividade do projeto de extensão “À Beira da Extinção”, que entre 2009 e 2021 investigou a história oral de ofícios em vias de desaparecimento na região, apenas um amolador de facas foi localizado.
Responsável pelo projeto, a professora Lorena Gill nasceu aparada pelas mãos de pegar criança de uma parteira – outra das atividades também acompanhada pelo estudo. Embora o parto humanizado esteja cada vez mais em voga, e trabalhos como o das doulas junto às parturientes esteja reconhecido, o trabalho das parteiras – cujos saberes unem tradição e dom – também diminui na região.
No entanto, o estudo articulado a partir do projeto não tem escopo nostálgico, mas de diagnose social e registro histórico. O desaparecimento das parteiras não estaria vinculado à melhoria da infraestrutura das estradas ou abertura de hospitais? Uma hipótese que apenas a pesquisa pode responder, entrecruzando depoimentos das colaboradoras com material de acervo, especialmente os que integram o Núcleo de Documentação Histórica - Professora Beatriz Loner.
Batizado em homenagem à professora que o fundou em 1990, o NDH surgiu para resguardar documentações dispersas pela UFPel. Mais tarde, passou a agregar acervos como o da Delegacia Regional do Trabalho, com mais de 600 mil fichas de dados e fotos de todo o Estado entre os anos de 1933 e 1968. Há ainda o acervo de processos trabalhistas da cidade de Pelotas e região, uma documentação da Justiça do Trabalho da Comarca de Pelotas, num total de mais de 100 mil processos entre 1941 e 1995.
Acompanhar as transformações nos ofícios é vislumbrar as mudanças na nossa própria sociedade e na relação que estabelecemos com o trabalho. Casos exemplares são os que ocorreram com duas das atividades artesanais mais antigas: o ofício de sapateiro e de alfaiate.
Nas entrevistas coletadas pelo grupo, o tom que perpassa a fala dos mestres artesãos é o ressentimento. Eles, que aprenderam seus ofícios trabalhando gratuitamente como aprendizes, buscaram repetir o processo de formação em um tempo que já não mais lhe cabia. Foram processados pelos ex-alunos, que exigiram direitos trabalhistas. A alternativa, tornar-se pequena empresa, também não prosperou. O que se dará destas profissões, só a história nos dirá.
Publicado no Voz Docente n. 8/2021
Por ADUFPEL
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